28 março 2005

Uma banal livraria numa esquina para a rua principal. Chuva miudinha mantém a cara fresca e um estado de espírito doentio favorável ao aspecto zombie que se tornou moda no mundo digital. O sujeito (sem nome, à boa maneira neo-realista), entra pois nessa loja. O seu objectivo é não mais que este: gastar dinheiro, ainda que lhe tenha custado mais a ganhar do que o seu verdadeiro valor. Uma escolha demorada para conseguir a melhor decisão. Mas a cereja do bolo torna o gosto pelo livro escolhido em bolo, melhor, em massa da base: um par de olhos vulgares, banais, redondos como todos, sérios como todos, castanhos como muitos. Só que o brilho; a imagem que se vislumbra para lá do globo ocular, mera janela rústica de um palácio de rei-sol. Porém, de imediato o fim da primeira ficção: ouro anelar num dedo. Logo nova esperança: forbidden fruit. Não: a voz dela diz que não, e de novo os carros, as nuvens, a inexistência de uma razão pequena para se conhecer a vida.
In Principio Erat Verbum: não, no princípio havia o nada que bastava. A palavra veio relegar o nada, extrema felicitas, para o lugar da impossibilidade. O uerbum, como um vírus, apoderou-se de todo o espaço. Deixemos o nada emergir da clandestinidade, e aperceber-nos-emos do que se é.