07 abril 2006

A viagem foi muito cansativa. O ar frio e húmido inutiliza os panos encardidos e sujos em forma de roupa que me cobrem. É noite. No meio das casas escuras e precárias, uma que emana luz; uma taberna. É disto que preciso; um bom vinho, uma mulher fácil de formas cheias, uma cama para passar o resto da noite. Cá fora, uns porcos vão tratando da imundície que atola o chão enlameado. Antes de entrar, ajeito o alforge onde levo a razão da minha presença aqui: um documento de vital importância que o Rei, refugiado num pequeno bosque rodeado de inimigos, envia ao seu cunhado, rei desta terra, e seu único aliado. Que acontecerá se o papel se perder? Muitas vidas, e se calhar entre elas todas onde corre o mesmo sangue que em mim, cessariam em menos de um mês. Se entrar nesta taberna, deitarei por terra o futuro da insígnia que, à nascença, tatuaram-me no peito? O vinho, terá veneno? A mulher, uma espiã? A cama, meu último e eterno repouso? O meu corpo está mais fatigado que o do atleta-hoplita próximo de Atenas, falta-me ainda um par de dias de viagem - mas não posso parar. Não vou parar. A vida do Rei acima das hesitações do meu corpo.