27 julho 2006



Pela manhã cedo, o pequeno Buda saía do seu palácio e entrava floresta adentro. Havia aí um lugar quase inacessível onde ele gostava de se sentar, ser rodeado por todas as formas de vida da Natureza, e rir. Esses momentos do dia eram sempre amenos; qualquer que fosse a época do ano, havia sol, e céu azul. A Natureza amava o rapazinho gordo de olhos semicerrados que a fazia feliz. Às vezes, o pequeno Buda recebia uma visita da cidade, para aconselhamento, mas só se encontrava com ele quem conseguisse chegar àquele lugar. As suas lições de vida eram muito apreciadas, não tanto pela vaguidade de um conselho oracular, mas pela simplicidade, carregada de profundos conhecimentos de vida, de que essas pequenas frases se compunham. Ninguém amava eroticamente o ser mais amado da Natureza, e, um dia, um viajante alemão, de olhos esbugalhados, por trás das lunetas curvas e pequenas, que ao fim de dois meses conseguira encontrar aquele ser que, fisicamente, classificou de "anão com peso regular"; esse viajante alemão perguntou ao pequeno Buda porque é que ninguém de entre os Homens o amava. O pequeno Buda, com poucas palavras, explicou àquele senhor de hábitos estranhos e sotaque acentuado que a Mãe Natureza amava Buda pela mesma razão que o fazia não ser amado por ninguém. A Mãe amava Buda porque ele era o oposto de toda a beleza que os homens admiram. Buda era a beleza primordial, a beleza quase selvagem, quase Terra. E a Mãe alimentava-se da Terra. Como o pequeno Buda era quase tão filho da Terra como da Mãe, a Mãe alimentava-se da Terra que Buda era e tinha. Porque Buda não era humano; humano era o corpo em que a Mãe o engarrafara. Duas horas depois, o alemão era ainda um vazio pleno de incertezas.